Conta-se que, há muito tempo, uma
caravana voltava de uma viagem do distante reino de Tiepur, liderada pelo Xeque
Hamal Saedah.
Era quase certo que no dia seguinte o
grupo alcançaria, antes do nascer da lua, os portões de Bagdá, encerrando a
longa jornada.
No entanto, Hamal Saedah demonstrava
inquietação e nervosismo.
Quando indagado sobre isso por um de
seus servos, respondeu, diante de todos os homens do grupo:
Nossa viagem está quase terminada, e
estou certo que nada de grave, de importante ou de curioso acontecerá com nossa
caravana.
Depois de ligeira pausa, acrescentou
desolado:
É por isso que pesa sobre mim uma nuvem
sombria de inquietações e de desgostos.
Afinal, duas caravanas foram enviadas
pelo nosso rei ao país de Tiepur, antes da nossa.
A primeira, chefiada por Labid,
enfrentou uma estranha aventura.
Os caravaneiros encontraram alta noite,
em pleno deserto, um guerreiro fantasma.
A segunda caravana, dirigida por Zobeir
Dayer, ao deixar o oásis de Amin, viu-se envolvida por uma imensa nuvem de
grilos selvagens e agressivos.
Um dos caravaneiros pereceu nessa
prodigiosa luta e dois outros ficaram feridos.
Labid e Zobeir, logo que regressaram,
foram recebidos pelo rei.
E cada um deles pôde narrar uma
aventura emocionante que arrancou aplausos e felicitações do monarca.
O que direi eu ao rei, quando
regressarmos?
Nada terei para contar. E isso, para
mim, é uma grande humilhação.
Ao romper da madrugada, Mojalek, um dos
caravaneiros, despertou os demais, aos gritos, informando que o Xeque Hamal
havia sido sequestrado.
Segundo narrava Mojalek, três bandidos
haviam lutado com o Xeque e, após dominá-lo, partiram a galope, levando-o.
Formou-se um grupo de resgate, que saiu
ao encalço dos bandidos, a fim de salvá-lo.
Quando alcançados, no entanto, os
bandidos não ofereceram resistência, fugiram como sombras, tomando rumo
ignorado.
O Xeque foi libertado com apenas um
ferimento na cabeça e dois outros menores junto ao nariz.
Não querias uma aventura? - indagou
Mojalek - Pois agora, terás o que contar ao rei.
No dia seguinte, porém, já em Bagdá,
quando era esperado pelo rei, o Xeque foi novamente interpelado por Mojalek.
Este lhe entregou um papel dizendo que,
se realmente pretendia contar a aventura ao rei, deveria antes lhe pagar o que
devia.
Surpreso, o Xeque leu o que havia no
papel:
Pelo pagamento para três falsos
sequestradores, 300 dinares; para o aluguel de quatro cavalos, 60 dinares;
pelas cordas e mordaças, 20 dinares, e para guardar absoluto sigilo, 5.000
dinares.
Envergonhado pela farsa ridícula em que
se vira envolvido, o Xeque pagou o que lhe foi exigido, porém, jamais narrou a
falsa aventura a quem quer que fosse.
Tendo em vista seu equivocado desejo de
ser considerado um grande herói e viver indescritíveis aventuras, foi explorado
de modo vil por um daqueles que o deveria servir.
Não são raros aqueles que passam a vida
esperando por um grande acontecimento, uma grande aventura.
Deixam de cumprir pequenas, mas
relevantes tarefas, porque se consideram destinados a feitos de maior
importância.
Assim, por orgulho, não se envolvem em
trabalhos que consideram menores, e, por conseguinte, jamais estarão preparados
para realizar grandes obras.
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